O suicídio de influencer norte-americana Dazharia Schaffer, 18 anos, que compartilhava com seus quase dois milhões de seguidores vídeos diários de dublagens, coreografias e outras brincadeiras chocou a internet no último dia 11 de fevereiro.
Esse e outros eventos trágicos estão inseridos em um contexto global ainda mais preocupante. Segundo uma pesquisa da OMS (Organização Mundial da Saúde), divulgada em setembro de 2019, o suicídio é a principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos do mundo todo, atrás apenas de acidentes de trânsito.
Segundo a psicóloga Tatiana Moreira, especializada no tratamento de jovens e adolescentes, apesar de as redes sociais terem um lado positivo, a ferramenta pode deixar as pessoas, sobretudo os jovens, mais expostos e vulneráveis. "Eu não costumo 'demonizar' as redes sociais. Por um lado, é fato que elas aproximam as pessoas, uma vez que possibilitam a interação à distância, e são de grande ajuda para aqueles que são mais tímidos e têm dificuldade para se relacionar na vida real."
"Por outro lado, os usuários ficam expostos a comentários maldosos, ao bullying e em alguns casos, até a ameaças. Isso, para o jovem, tem um impacto ainda mais profundo, pois é nessa fase da vida que as pessoas estão construindo a própria identidade — se afastando um pouco da família, suas referências primárias, e buscando outras", completa.
Um estudo da Unifesp (Universidade de Federal de São Paulo) revelou que enquanto os índices de suicídio caíram no mundo entre 2006 e 2015, a taxa de adolescentes brasileiros que tiraram a própria vida aumentou 24% no mesmo período. Entre as causas que justificariam esse aumento, de acordo com os pesquisadores, está a popularização da internet.
O uso das redes sociais se torna um problema ainda na medida em que os jovens não só expõem a própria vida, como também acompanham a vida de outras pessoas, que selecionam a melhor parte de si para exibir ao mundo, passando a falsa ilusão de que estão sempre felizes.
Para Tatiana, o problema não afeta o psicológico apenas daqueles que "compram" essa falsa imagem, como também daqueles que a vendem. "O jovem não está mostrando ali quem ele é de verdade, tampouco querendo achar seus iguais. Ele está tentando promover uma ilusão, uma autoimagem de algo que ele não é."
"Ele pode estar rindo nas fotos, ganhando milhares de curtidas e não estar feliz. Ninguém é feliz o tempo todo. A tentativa de passar essa impressão é um indicativo de que algo com aquela pessoa não vai bem", completa.
No outro extremo de um usuário que ganha milhares de curtidas, há também aqueles que não recebem o retorno esperado — os famosos "flopados", na gíria dos jovens. Quando um vídeo não viraliza e recebe poucas visualizações, curtidas e comentários, isso quer dizer que ele "flopou", fracassou. A impressão que fica para o usuário, claro, é a de que ele não é bom, bonito ou engraçado o suficiente.
É de suma importância, portanto, que os jovens reflitam sobre os verdadeiros motivos que os levam a querer participar das redes sociais — e interrompam o uso caso julguem necessário.
"Vale se perguntar 'o que é que eu estou buscando? Apenas diversão, novas amizades ou necessidade de autoafirmação?' Se a resposta for 'necessidade de autoafirmação', isso é um problema. Uma pessoa não pode ficar refém da aprovação do outro para se sentir bem com ela mesma."
Tatiana ressalta ainda que os jovens devem evitar acompanhar pelas redes sociais pessoas que os joguem para baixo e os façam sentir insuficientes. "Seguir blogueiras que estão sempre postando fotos bonitas em lugares bonitos com seus corpos sarados, passando a impressão de que têm a vida perfeita, não agrega em nada."
"Além disso, ter essas pessoas como parâmetro pode pode ter profundo impacto sobre o processo de autoaceitação, uma vez que a maioria das pessoas têm que trabalhar, correr atrás e não têm aquele corpo idealizado pela sociedade", completa.
Devido ao isolamento social imposto pela pandemia da covid-19, a preocupação com a saúde mental dos jovens, que se viram obrigados a ficar reclusos em suas casas e fizeram uso mais frequente das redes sociais, se faz ainda mais legítima.
Uma pesquisa da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, divulgada em 2018, que analisou as experiências de 143 estudantes de 18 a 22 anos com as três plataformas mais populares entre os alunos da graduação (Facebook, Snapchat e Instagram) concluiu que usar redes sociais por menos tempo leva a reduções significativas tanto da depressão quanto da solidão. Os efeitos são particularmente válidos para aqueles que estavam mais deprimidos quando deram início ao estudo.
Para Tatiana, a maior preocupação, no entanto, não é o tempo gasto nas redes sociais, mas sim a motivação por trás desse uso.
"Por conta da pandemia, as redes sociais acabaram se tornando um espaço de promoção de convivência, de vínculo, de laços. Não foi incomum ver pessoas que promoveram festas de aniversário e outros eventos no ambiente online. Por outro lado, a pandemia afetou o psicológico de todas as pessoas. Nesse contexto, alguém que faz uso das redes sociais pelos motivos errados, como autopromoção, pode acabar se frustrando e ficando ainda mais vulnerável emocionalmente."
Existem alguns sinais que podem ser um indicativo de que um jovem está precisando de ajuda, sendo o principal deles o isolamento. "A pessoa fica muito sozinha, muito voltada para si, não procura mais os amigos, os familiares. Nós, seres humanos, somos muito sociáveis — uns mais, outros menos, mas em alguma medida, todos dependemos do outro de alguma forma", diz. "O afastamento tanto das pessoas quanto das atividades, portanto, é um sinal para o qual se deve ficar muito atento."
Tatiana ressalta que transtornos mentais, como depressão e ansiedade, devem ser tratados com ajuda profissional de um psicólogo e, se necessário, de um psiquiatra. Aos amigos e familiares, resta, se houver abertura, realizar uma escuta passiva sem emitir qualquer juízo de valor.
*Estagiária do R7 sob supervisão de Pablo Marques
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